IDEIAS
12
EXTRA
CLASSE Agosto /2010
Foto:
Lívia Motta / Arquivo Pessoal / Divulgação
“A
audiodescrição é uma mágica
que faz
os cegos enxergarem”
A
audiodescrição
é uma mágica
que faz
os cegos enxergarem”
– esse
foi o comentário feito
por
Roberto, pessoa com defici
-
ência
visual, de Campo Grande,
logo após
o término da ópera Rigoletto, no
Theatro
São Pedro, em São Paulo na últi
-
ma semana
de julho. A expressão, que para
muitos
pode parecer exagerada e utópica,
traduz
com clareza o que significa este re
-
curso de
acessibilidade para as pessoas com
deficiência
visual. A famosa ópera de Verdi,
que conta
a história de amor, vingança e
morte do
corcunda Rigoletto, bufão da cor
-
te do
Duque de Mantova, e de sua ingênua
filha,
Gilda, pôde ser conhecida e compre
-
endida em
toda a sua complexidade e deta
-
lhes
cênicos por Roberto e por outras mui
-
tas
pessoas com deficiência visual presentes
nas cinco
récitas desse espetáculo grandio
-
so, com
direção cênica de Lívia Sabag.
Com a audiodescrição
e leitura das
legendas,
as conquistas e desventuras amo
-
rosas do
Duque de Mantova, o jeito zom
-
beteiro,
irônico, debochado e impiedoso de
Rigoletto
como bobo da corte e, ao mesmo
tempo,
seu zelo e preocupação de pai apaixona
-
do, e sua
amargura pela sua condição de pessoa
com
deficiência física; a decepção de Gilda com a
traição
do amado, as armações do assassino pro
-
fissional
Sparafucile e de sua irmã Maddalena; os
salões do
palácio, a casa de Rigoletto, a estalagem
rústica
de Sparafucile, as roupas dos nobres e os
vestidos
das damas da corte, tudo isso pôde ser
vivenciado,
em igualdade de oportunidades, sem
barreiras
comunicacionais que tanto impedem o
pleno
acesso às informações e ao mundo dos es
-
petáculos.
Desde o
ano passado, quando foram apre
-
sentadas
as óperas: Cavalleria Rusticana, Pagliac
-
ci e O
Barbeiro de Sevilha, que o Theatro São
Pedro,
contando com a parceria da Vivo, passou
a ser um
lugar acessível para as pessoas com defi
-
ciência
visual. Lá foram instalados equipamentos
como
cabine, mesa de som, fones de ouvido e re
-
ceptores
para que os audiodescritores pudessem
narrar,
com detalhes, cenários, figurinos e as ações
dos
solistas no palco, além de descrever o bonito e
histórico
Theatro São Pedro.
A
audiodescrição é, pois, um recurso de aces
-
sibilidade
que amplia o entendimento das pes
-
soas com
deficiência visual em eventos culturais
(peças de
teatro, programas de TV, exposições,
mostras,
musicais, óperas, desfiles, espetáculos
de
dança), turísticos (passeios, visitas), esportivos
(jogos,
lutas, competições), acadêmicos (palestras,
seminários,
congressos, aulas, feiras de ciências,
experimentos
científicos, histórias) e outros, por
meio de
informação sonora. Transforma o visu
-
al em
verbal, abrindo possibilidades maiores de
acesso à
cultura e à informação, contribuindo
para a
inclusão cultural, social e escolar. Além das
pessoas
com deficiência visual, a audiodescrição
amplia
também o entendimento de pessoas com
deficiência
intelectual, idosos e disléxicos.
Conhecendo
esse potencial inclusivo do
recurso e
sua aplicabilidade, professores podem
fazer uso
dele em sala de aula, descrevendo o
universo
imagético presente na escola como ilus
-
trações
nos livros didáticos e livros de história,
gráficos,
mapas, vídeos, fotografias, experimentos
científicos,
desenhos, feiras de ciências, visitas
culturais,
dentre outros, sem precisar de equipa
-
mentos
para tal, mas cientes da importância de
verbalizar
aquilo que é visual. Isso, certamente,
irá
contribuir para a aprendizagem de todos os
alunos e
não somente dos alunos com deficiência
visual.
Estes ganharão em independência e auto
-
nomia,
além de mais oportunidades de aprendi
-
zagem e
conhecimento de mundo, e aqueles que
descrevem
poderão desenvolver o senso de ob
-
servação,
repertório linguístico e fluência verbal.
Não dá
mais para nós, professores, ficarmos
fora
desse grande movimento inclusivo que vem
chegando
a todos os contextos. Cabe-nos, tam
-
bém, a
preocupação com a remoção de barreiras
comunicacionais
e, principalmente, atitudinais,
que tanto
impedem a transformação da escola
em um
lugar possível para a diferença. E nossa
mobilização,
certamente, poderá provocar:
Um voo de
muitas asas,
que fazem
uma brisa forte,
brisa de
novos ares,
que
arrepia mares,
atrapalha
os cabelos,
e joga
papéis velhos
e velhos
papéis para o alto,
e para os
mesmos lugares,
nunca
mais eles voltam ...
* Doutora
em Linguística Aplicada e Estudos da Linguagem pela PUC de São Paulo e atua na
área de inclusão cultural das pessoas com deficiência visual, com foco na
formação de
audiodescritores
para teatro, cinema, TV e outros espetáculos, eventos sociais e pedagógicos. É
coordenadora de acessibilidade do Programa Vivo Ence
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